“Se o sal perde seu sabor, como tornará a ser sal?” (Mt 5, 13)
O homem se compraz em contemplar o fogo e o mar em movimento. Neles não há lugar para rotina, Há sempre novidade. Não se esconde de ninguém o fato de que, com o passar do tempo, os mais altos ideais, os maiores amores, os intusiasmos mais fortes correm risco de perder seu vigor. Sem que nos demos conta, começam a morrer em nós, e com eles, pouco a pouco, somos nós mesmos a morrer. Curiosamente, nosso ocaso interior não é uma questão apenas nossa. A perda pode afetar outras pessoas. O sal vai perdendo seu sabor…”Se o sal perde o seu sabor, como tornará a ser sal?”
Por trás dessa simples pergunta de Jesus, está em jogo a qualidade de nossa vida e o valor de nosso testemunho… motivo pelo qual convém perguntar-nos se não estamos perdendo o sabor.
O testemunho cristão não é só uma questão de palavras; mostra sua verdade com o exemplo da vida. Não é estranho que Jesus, querendo especificar nossa missão no mundo, tenha comparado nossa tarefa com a função humilde do sal. No cristianismo, a qualidade da vida está ligada à missão que temos de desempenhar para tornar os outros felizes.
É esta a ocasião de nos indagarmos com muita simplicidade e honestidade como estamos vivendo o Sermão da Montanha, porque é nele que se fala da força do sal.
No Sermão da Montanha, resumem-se as exigências mais radicais do cristianismo e com base nelas podemos ter a medida de nosso sabor. Naquele sermão se pede ao seguidor de Cristo que tempere a existência humana com sua vida e com sua palavra. Seu modo de viver não é algo fechado e deve ser tão saboroso que possa impregnar de sabor a vida dos outros. Ali nos é ensinado a perdoar, a amar o inimigo, a usar de uma justiça que seja mais exigente que a deste mundo, porque não se contenta com a letra, mas vai ao fundo da verdade; ali nos é ensinado a ser radicais na pureza, a limpar nossos olhos de todo o olhar turvo, a não julgar o próximo, a reconciliar-nos com o irmão antes de aproximar-mos do altar, a não viver para acumular tesouros que a traça consome, a não transformar o dinheiro em um deus, é-nos ensinado também a não nos exibir procurando ser vistos e aprovados pelos homens e, acima de tudo, a confiar na Providência e a orar ao Pai com a confiança e o amor que só um filho pode ter.
O Sermão da Montanha oferece-nos critérios muito diversos dos critérios deste mundo. Para Jesus, são felizes os pobres, os que têm fome de justiça, os que repelem a violência, os que trabalham pela paz e os misericordiosos.
O cristianismo não consiste só em crer em Deus. Supõe em enpenhar-se em viver o Sermão da Montanha na realidade de cada dia.
O sal não o é para si mesmo. Ele desaparece, mas é a qualidade de seu sabor o que transforma o todo. Impregnando a massa com sua presença, o todo adquire o gosto. Ele não arrebata à comida seu sabor. Ao contrário, realça-o.
É oportuno verificar a qualidade de nosso compromisso com o Evangelho. Inconcientemente, podemos estar levando uma existência insípida.
À luz da pergunta de Jesus, vale a pena perguntar-nos: Que cristianismo vivemos? Qual é a mensagem que irradiamos? Qual o sabor de nossa vida? Um cristianismo insípido, sem tempero, só serve para ser jogado fora.
É possível que a vida tenha arrefecido o entusiasmo de nossa fé primeira e que vivamos um ateísmo prático. O que podemos fazer? Se o sal perde o seu sabor, como tornará a ser sal? Graças a Deus, o Senhor nunca fecha ao homem todas as portas, e Ele nos lembra que o que é impossível para os homens é possível para Deus. O cristão, por graça do Senhor, pode nascer de novo (ver Jo 3)… e o sal pode voltar a ser sal.